Polarização e livres idéias

A política é a arte da negociação, da concessão. A boa política significa esse exercício, mas com objetividade.  Males menores justificam-se, para atingirem-se bens maiores. A coletividade é beneficiada, portanto alguns sacrifícios pontuais tornam-se necessários.


A teoria política versa sobre isso, e há autores interessantes que discorrem sobre não apenas essa característica humana, essa ciência, mas sobre o que constitui em verdadeira "arte", dada à sua complexidade e milhares de variáveis. Quando a política é feita tendo em mente o bem coletivo, geralmente é boa. Quando o benefício é individual, geralmente trata-se de péssima política, mas é bastante comum, como sabemos.

A democracia é um bom veículo para o exercício da política. Ela permite que seja dada voz a todos os integrantes da sociedade. A ditadura, o autoritarismo, consistem em massacrar, desmoralizar ou tornar ilegal qualquer oposição ou discordância da opinião dos governantes. Em um regime assim, falseado em democracia ou assumido como um regime de exceção, vozes discordantes são banidas, muitas vezes fisicamente.

A harmonia social acontece quando se aceitam as diferenças de opinião e de ação. A imposição da uniformidade é possível, mas apenas mediante a eliminação do livre arbítrio, do livre pensar, das idéias. Tal eliminação é apenas temporária, pois o ser humano nasce e deseja viver livre.

Um grande problema sobre a diferença de opinião é que quando versam sobre questões fundamentais ou estruturais, pode-se criar uma divisão social grave, a ruptura. A Revolução Francesa nos demonstrou, bem como as guerras civis nos demonstram hoje em dia, como é destrutiva a ruptura, quantos sofrem pela destruição total da sociedade, por algumas idéias inconciliáveis ou a tentativa da imposição de um conceito sobre a diversidade.

O Brasil vive uma democracia. Uma muito imperfeita democracia, mas os EUA também não são diferentes, mudando apenas a forma e efetividade do exercício do direito, que são gritantemente diversos dos brasileiros. Gostaria de louvar a liberdade de expressão que ainda possuímos no Brasil.

Há hoje policiamento ideológico nos dois espectros da política brasileira. Tanto os adeptos do petismo, mais radical ou não, quanto aqueles liberais absolutos, ficam dando tiros e a maioria das pessoas fica no meio, como sempre, sofrendo com as balas perdidas (ou achadas).

Apesar de minha escrita metendo pau no PT, louvo esse partido por não ter ainda decretado o fim da livre imprensa e liberdade de opinião. Mas meu louvor pára por aí, pois vejo diversas manifestações organizadas pelo PT, em todo seu espectro, bem como partidos que lhe apoiam e as centrais sindicais, adotando um discurso destrutivo da diversidade e mesmo da liberdade de opinião. Tenho a convicção de que não baniram a liberdade de opinião por incapacidade, não por falta de vontade. Sei que essa acusação é grave, mas é a percepção clara que possuo e parece que, em cada manifestação de palanque do "chefe" ou dos comparsas, mais convenço-me da intenção em eliminar oposições, por qualquer via possível, inclusive as mais baixas e indizíveis.

Na academia, em alguns segmentos, há o patrulhamento ideológico e no Brasil ele está forte. Seja para um lado quanto para outro. Os pensamentos livres estão se comprometendo. 

O Brasil está sofrendo de enorme polarização política, e polarização NUNCA é coisa boa.

De um lado o PT, que governa há 12 anos, com sua coalização parlamentar, abafa, desmoraliza e agora tenta destruir os demais partidos de oposição, em especial o PSDB (que já sofre com um tal fogo-amigo). Utiliza-se o dinheiro público para sedimentar conceitos na academia, nas políticas públicas, nas relações internacionais, no relacionamento entre os poderes, para garantir uma visão unitária de país, de sociedade, gerando distorções que custarão uma geração para consertar, tal como foi com os militares.

Do outro lado surgem os liberais radicais, que surdos, desconhecem a necessidade do Estado assistencial para parte da população, importando conceitos estrangeiros de livre-empresa a um país que é miserável e cuja população desconhece o sentido de coletividade. Pregar o individualismo, para esses, justifica-se, o que me parece absolutamente equivocado, pois se a livre empresa é necessária, ela deve, como reza a Constituição, possuir uma função social, assim como a propriedade.

Com o debate eleitoral se avizinhando, cada vez mais faltam vozes moderadas. Estas não fazem manchetes, não vendem jornais e não geram blogs populares. Ao se pesquisar na internet a popularidade e audiência de certos blogs, constatamos que as cores estão ficando cada vez mais fortes.

Penitencio-me inclusive, já que ao enxergar os absurdos e equívocos de um desgoverno como o atual, da Dilma, que conseguiu piorar o já detestável governo de Lula, em diversos aspectos, passo a lançar mão de alegorias e caricaturas para detonar o que acho um governo que está criando atraso e desagregação.

Isto dito, minha reflexão e o convite ao leitor é pensarmos como podemos ficar um pouco a salvo (eu inclusive) das cores fortíssimas que passam a colorir a paisagem política, sem que nos tornemos maus, mesquinhos e destrutivos.

A radicalização que está se formando no horizonte convida a confrontos e destrói a própria natureza da política, como prática, ciência e arte. O país amadurece quando admite a assistência aos desprovidos e sua inclusão na economia, sociedade e ensino, mas ao se transformar tal bandeira em um regime exclusivo, ao eliminar outras parcelas tão importantes da sociedade, jogando-lhes a pecha de sabotadores de um programa de governo, cai por terra qualquer argumento favorável à integralidade das ações governamentais.

Ao falar em opinião livre e política, fica o gosto amargo na boca sobre o atualíssimo caso da saúde e importação de médicos, promovido por um ministro que deseja-se governador de SP. O governo desconhece opiniões contrárias, desmoraliza os dirigentes de uma das classes que mais goza de credibilidade no país, como os médicos. Assim, dá-se exemplo de como sabotar a sociedade, colocando uma agenda mesquinha diante do interesse público, do debate, meramente para garantir a sua permanência no poder, ao que tudo parece. 

Esse fato maléfico, associado a tantas outras obtusidades da administração, levam a crer que esse governo cava sua falta de legitimidade, insiste na insensibilidade no exercício do poder, resultando no desestímulo econômico e social crescente. 

Essa parece ser a receita do fracasso, a despeito das emendas bondosas e tantos outros estratagemas para "dourar a pílula". 

Como não teremos golpe de estado, pela mesma razão pela qual Lula não sofreu Impeachment pelo Mensalão, em virtude das vozes que se levantam e dos "pensamentos livres", estamos fadados a reconhecer que haverá mudança de poder.

O lastimátvel é que tudo anuncia que a transição será traumática, um processo destrutivo, muito antes de ser criativo como o brasileiro realmente gosta.

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