Mensagem póstuma à indústria nacional

O título acima poderia também ser: "Como se faz um lobby de sucesso."

Sabemos que a desindustrialização brasileira tem acontecido de forma gradual e contínua, não podendo ser revertida.

Sabemos que a indústria não apenas dá emprego. Ela permite investimentos em P&D, forma profissionais, forma capital para novos investimentos, cria uma elite empreendedora, enfim, possibilita o crescimento intelectual, social e econômico de uma nação.

O governo federal pouco fez para reverter a situação da indústria nacional. O Congresso também. As intervenções pontuais como redução de IPI de carros (feitos, diga-se bem, por multinacionais que ao estarem no Brasil recebem privilégios, em contraponto aos importados), aumento radical no imposto de importação dos mesmos carros, zero IPI na Linha Branca, e tantas outras iniciativas pontuais ajudaram, deram um refresco, não significando reversão fundamental do cenário. Essa reversão viria da reforma fiscal e trabalhista, mas isso implica em muita política e um país administrado por sindicalistas não vai jamais reduzir direitos trabalhistas, que lhes dão sustentação política...

Há também o cenário externo. A China e outros países produzem mais barato e começam a produzir muita coisa melhor que o Brasil ou outros países. A exportação de empregos aconteceu, e o Brasil sofreu. O Brasil, no governo Lula, reconheceu a China como membro da OMC, dando-lhe status de leal no comércio internacional, o que não é verdade. O movimento foi político (como a maioria das decisões econômicas desde que o PT assumiu), fazendo com que a indústria brasileira fosse varrida do mapa, em alguns setores (ex. calçado, vestuário e siderúrgico, dentre inúmeros), por uma indústria chinesa predatória.

O Brasil, portanto, constatamos bem, é mal gerido. A CNI, liderada pelo mineiro Robson Andrade, ex-Presidente da FIEMG, grita sempre, mas não é muito ouvida. O desânimo do setor industrial brasileiro só não é maior pelas medidas protecionistas adotadas por grandes compradores, como Petrobrás, que exigem conteúdo nacional mínimo, ou o BNDES, que também exige conteúdo nacional para FINAME e outras fontes de financiamento.

Hoje, então, não é de surpreender ver um sinal ínfimo, pequeno, de enorme desprezo pela indústria nacional e ausência total de senso público.

Dê uma olhada nessa notícia.

Sim, caro leitor. O Senado passou um projeto que aumentará a cota de Freeshop para 1.200 dólares. Lembre-se que Freeshop é administrado no Brasil todo por uma empresa monopolística, a Dufry. Não existe concorrência. Só diz que há concorrência quem tem má-fé ou nunca viajou... não é o caso dos senadores... e os deputados irão votar em breve, certamente fazendo essa "bondade".

E olhe que o dólar ficou 30% mais caro nos últimos 12 meses...

O que a medida significa?

Para uns, a farra de comprar mais um pouco na chegada da viagem internacional.

Para mim, significa que o Brasil realmente não entende de prioridades. A mensagem que recebo é que a indústria nacional pouco importa e que agora, bebidas, perfumes, roupas e eletrônicos serão isentos de impostos. Os argumentos da reportagem e dos senadores são cômicos, se não fossem trágicos.

E vejam bem, a proposta é de um senador do PSDB e o relator do PTB... eles alegam que a carga tributária irá cair... Lamento, mas se penso mais de 2 minutos no assunto, acho que a Dufry fez um lobby bonitinho encima de algum senador para emplacar esse projeto de aumentar o faturamento por cliente de 500 para 1200 dólares. Alguém aí faz a conta?...

Uma pena essa demonstração de descaso. Descaso não. Vergonha mesmo.

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