Palavra de ordem: desglobalizar
Em qualquer combate militar, quando generais são competentes, responsáveis e bem treinados, antes do engajamento em batalha há salvos de advertência, trocando-se mensagens e dando opções para se evitar a iminente carnificina.
Antigamente, as guerras transcorriam entre forças militares ou navais, não se estendendo a populações civis, na maioria das vezes. Isso explica como durante milênios cidades foram razoavelmente preservadas mundo afora, a despeito de guerras duras e longas. Ao viajarmos a países com civilizações antigas, como na Ásia ou Europa, encontramos estruturas urbanas milenares preservadas... bairros mesmo.
Na Primeira Guerra Mundial, o ataque a populações em cidades era exceção, pois até então os generais em todas as forças armadas eram oriundos das altas classes dominantes, da nobreza, havendo um código ético de que guerra se fazia entre soldados, deixando inocentes de fora.
O combate era majoritariamente corpo-a-corpo. Os tempos modernos vieram, grande parte das hostilidades passaram a ser feitas à distância, com o uso de obuzes, canhões com foguetes e mísseis atualmente teleguiados e de alta precisão, usando drones, aviões ou até mesmo espaçonaves e satélites. Matar-se em guerra hoje não dá o remorço ou a mesma emoção que se sente no combate corporal.
Séculos atrás, entre dois pólos da batalha havia sempre um campo deserto. Esse campo serviria tanto para indicar que a distância entre inimigos potenciais seria um convite ao entendimento e à paz, quanto para situar geograficamente onde o confronto ocorreria, caso os esforços de diálogo fracassassem.
Guerrilhas sempre ocorreram, isoladamente e em formato limitado, na história dos conflitos humanos.
As guerrilhas urbanas são coisa relativamente moderna, segundo minhas pesquisas, vitimando civis inocentes que nada tem a ver com rusgas militares ou ideológicas em grande escala. Exceto regiões como Gaza ou outros conflitos pontuais, são exceção.
Elas foram inauguradas por quem não tinha exércitos formais, como na revolução bolchevique, em que os comunistas, a despeito de cooptarem inicialmente alas militares russas para seu projeto político (posteriormente todos os generais pré-1918 foram fuzilados, ao perceberem o real intento de implantar-se um regime totalitário sem qualquer ética ou moral, assassino), romperam regras para criarem o máximo de caos e vítimas. Esse seria o caminho seguro para, organizados em meio à desorientação geral, os bolcheviques tomarem o poder e massacrarem, em seguida, qualquer oposição, militar ou civil. O mesmo modelo é utilizado hoje pelas organizações criminosas do tipo PCC, CV e grupos terroristas islâmicos.
O modelo soviético de guerra sem regras, da conquista do poder sem ética ou regras, estendeu-se, virou novo paradigma mais de 100 anos atrás para vários grupos odiosos.
A Segunda Guerra Mundial utilizou-se, assim, da nova forma cruel e covarde de batalhas: a destruição de cidades, ameaçando populações civis como método de guerra psicológica e real.
Os comunistas jogaram no lixo qualquer ética militar ou destrutiva, assim definindo novas regras que inspirariam os socialistas nacionalistas alemães: os nazistas. Nas ruas de algumas cidades do ocidente atual o eco disso é representado pela frase "by all means" (por qualquer meio), demonstrando a crueldade ilimitada sendo banalizada por grupos ultra-progressistas, ativistas pró-palestinos e outros movimentos desumanizadores.
A sanha destrutiva a tudo e todos, decorrente do supremacismo racial que lhe marcou (e ainda marca na forma do neonazismo), só seria comparável à covardia soviética (atualmente vista em tempo real na invasão ucraniana) arrasando qualquer território por onde passou e passará, não importando ser rural ou urbano, povoado ou não.
A campanha nazista contra a cidade de Londres (de 7 de setembro de 1940 a 11 de maio de 1941, ou seja, durante excruciantes oito meses), atacada por via aérea ininterruptamente todas as noites por meio de bombas incendiárias, dizimando população e infraestrutura, é o símbolo mais nítido dessa mentalidade da guerra total.
Algum troco foi dado contra os alemães, representado pela campanha de bombardeamento-tapete. A cidade de Dresden entrou para a história como a resposta à guerra total nazista, sucedida pouco tempo depois por Hiroshima e Nagasaki, na nova linguagem de ameaça de total destruição sobretudo de populações civis, com efeitos geopolíticos ecoando até os dias atuais.
A PAZ PELO COMÉRCIO
Diante de tanto potencial destrutivo e especialmente após o desaparecimento de centros urbanos europeus inteiros entre 1939 e 1945, estabeleceu-se que o comércio internacional seria o melhor caminho para promover-se e, talvez, preservar-se a paz duradoura.
As instituições multilaterais de Bretton Woods, Fundo Monetário Internacional e Banco Mundial (para reconstrução e desenvolvimento, na sigla em inglês BIRD), associadas à Carta de Havana, que proporia a criação da Organização Internacional de Comércio (que jamais viu a luz do dia), mas que se contentou com o Acordo Geral sobre Tarifas e Comércio (GATT), teriam como propósito gerar a convergência de países pela via do comércio, permitindo-lhes trocarem, prosperarem e na interdependência deixarem de sucumbir às tentações de enfrentamento militar no futuro.
A paz pelo comércio gerou prosperidade, o mundo jamais viu tamanha redução de pobreza disseminada sobre o planeta, enquanto sua população crescia exponencialmente.
Criou-se a OMC (Organização Mundial do Comércio), em 1994, com regras claras para redução de barreiras tarifárias e não tarifárias, bem como outras sobre disputas comerciais. A concertação sobre regras criou sensação de um estado de direito que seria observado pelas nações partícipes do ideário de que, preservando suas soberanias, interagiriam para o benefício próprio e da humanidade.
Ainda faltam 20 anos para comemorar-se o centenário da ausência de uma deflagração mundial. Em 2045, caso algum bom senso prevaleça nas nações do mundo, sobretudo aquelas poderosas e detentoras de armas de destruição em massa, nós e nossos sucessores deverão sair às ruas para dançarem e cantarem 100 anos de paz mundial, a despeito das guerras localizadas, do ódio localizado, das guerras civis pontuais.
Poderia parecer pouca coisa, mas não é.
O simples fato de ainda haver certa concertação mundial para que não haja uma confrontação aberta entre nações sem observarem-se fronteira ou regra alguma é digno de comemoração, coisa talvez que algumas pessoas não enxerguem, criticando por criticar ou de maneira infundada o mundo em que vivemos e suas conquistas.
A paz pelo comércio induziu a um processo de globalização: empregos foram migrados de países a outros, produções inteiras, pesquisas plurinacionais foram inauguradas, o nível de colaboração passou a ser infinito, só que tudo se baseia em uma premissa única: confiança.
Apenas com um sistema de confiança funcionando é possível haver globalização, haver motivação para trocas internacionais.
Essa confiança vem sendo corroída há muitas décadas. Ela se inicia sempre pela desconexão entre povos e seus representantes. O egoísmo e obtusidade desses vitima aqueles.
Em sendo a democracia o sistema de governo superior às demais opções, segundo expressão reputada ao grande político e primeiro-ministro que salvou a Inglaterra do nazismo, Sir Winston Churchill, ela permite com que grupos bem organizados tomem o poder sem terem exatamente aderência aos anseios de médio e longo prazo das populações cujo estado, em seu nome, administram.
Esse fenômeno acabou gerando uma imensa desconfiança nos líderes políticos, bem tratada na obra de James Weinberg, Governando na Era da Desconfiança. Weinberg ensina como os políticos são depositários, fiduciários de expectativas populares e, ao traí-las, disseminam e consolidam desconfiança. Tudo isso pode ser um projeto de poder bem arquitetado, já que ao se questionar tudo e todos, apenas grupos unidos sob ideologia forte conseguem dominar a maioria.
Isso também explica o absenteísmo recorde nas eleições em países democráticos. Os mesmos países que outrora definiram a prosperidade iluminista do mundo atual... aos poucos podem estar-se tornando similares a ditaduras, já que democracia falseada a aquelas se equipara, com a desvantagem de não ser assumida, nem autêntica como ditaduras às claras.
Tal desconfiança, obviamente, se estenderia ao campo internacional.
Líderes fracos, covardes, mantidos no poder apenas por estratagemas eleitorais, sem vínculo íntimo com o povo que deveriam representar adequadamente, projetam também para fora de seus países sua insegurança, hesitação e covardia, aliando-se àqueles com quem se identificam: outros líderes fracos e covardes.
Em tal ambiente, como a globalização da prosperidade se manteria?
O mundo viveu, em 2008, uma crise financeira e econômica gravíssima, que atingiu o coração da indústria que vive da confiança: a bancária. A partir dali, os países sobretudo industrializados e de economia mais sofisticada se retraíram. Dados demonstram como 2011 foi o ano de maior imposição de medidas protecionistas comerciais da história desde a Segunda Guerra Mundial.
Os campeões desse protecionismo foram os países europeus. Impuseram barreiras tarifárias e não-tarifárias. Os EUA, surpreendentemente (para muitos), guardou sua economia abertíssima, aliás a mais aberta do planeta dentre países industrializados.
Os países asiáticos, em plena prosperidade decorrente do seu papel econômico anti-cíclico, não sofreram profundamente, nem impuseram barreiras ao comércio. Esses ainda estavam subindo a curva da inclusão comercial internacional, atraindo indústrias poluentes e menos intensas em tecnologia emigradas dos países ricos, assim gerando empregos e prosperidade local.
Só que estava lançada a semente do nacionalismo comercial representado pelo protecionismo. A sensibilidade sobre a necessidade de proteção das economias, das populações locais, passou a existir desde 2008, a despeito dos fracos líderes que se seguiriam, insensíveis ao flagelo de suas populações, a porvir.
Acima, foto de família monoparental nos EUA, morando em carro por causa da crise de 2008
A pandemia gerada pelo Coronavirus acirrou o problema. Aí sim, os países passaram a olhar para dentro. A relocalização de indústrias, diante da urgência decorrente da paralisia da cadeia logística global, passou a assumir importância não apenas nos conselhos de empresas privadas, mas nas ruas, no comércio. Estava lançada a pedra inaugural da desglobalização, sem qualquer pompa ou circunstância.
A PAZ PELAS ALIANÇAS SÓLIDAS
O rearranjo geopolítico passou a se definir a partir da desconfiança.
A pandemia gerou narrativas e contra-narrativas que minaram totalmente a confiança nas instituições públicas, na política. Como reação, esses mesmos líderes fracos impulsionaram a censura, sobretudo às redes sociais, almejando quebrar o termômetro, ao invés de atacarem a doença que causa a febre.
Ao se mirarem nas ditaduras e no totalitarismo, como fez o Canadá, cujo governo esmagou ilegalmente um movimento de oposição popular que pugnava pela opção por tomar ou não vacinas, ou o Brasil, cuja alta corte passou a impor censura prévia e crime de opinião, tais governos e líderes fracos passaram a fomentar a desconfiança. E tal desconfiança apenas fortalece grupelhos organizados.
A lição de tudo, o resultado desse período que vem marcar os últimos 16 anos, é o enfraquecimento da vontade de contratar espontaneamente. Localmente. Globalmente.
O Brasil tem como presidente um sujeito condenado por graves crimes contra a administração pública que, à revelia do devido processo legal ao qual foi submetido e condenado, está no poder ancorado em pessoas-chave (inclusive seu ex-advogado) que lhe permitiram ascender e guardar-se, novamente, no poder. Nada disso indica ser o mesmo legítimo na pura acepção da palavra, já que desconectado das instituições que o julgaram e que deveriam ter sido preservadas sobretudo pela mais alta corte do país. A desconfiança é persistente, incurável e ela passou a atingir não apenas o sujeito, mas a todos os que o catapultaram ao poder por vias altamente questionáveis, objeto de inúmeras denúncias, protestos e faniquitos.
O grupo político atualmente no poder no Brasil sempre utilizou-se de frases de efeito e slogans populistas revolucionários como anti-imperialismo, interesses estadunidenses, e até mesmo o bordão Yankees-Go-Home!. Foram décadas gritando essas frases de efeito, que para a elite brasileira virou algo banal, pitoresco, até haver gente como eu, que emigrei ao levar a sério outras ameaças revolucionárias, no melhor estilo cubano. Para estrangeiros, definiu-se a falência moral de uma nação que tinha tudo para ser uma potência planetária em razão do seu povo, território, indústria e riquezas naturais.
Os bordões agressivos e anti-ocidentais vêm minando progressivamente qualquer credibilidade do Brasil, aliados à incapacidade de se auto-governar, como comprovado nos quase 40 mil homicídios anuais, a despeito de comemorações quando esses números atrozes caem 5%, ou na irresponsabilidade fiscal que engorda funcionários públicos enquanto desidrata os empregadores e os pagadores de impostos.
Diante das provocações, materializadas recentemente em declaração nos BRICS do tipo "quem precisa dos Estados Unidos?", apenas para colocar o país, suas riquezas e seu povo no colo hegemônico do regime chinês, surgiu uma reação de quem pouco se importa com imagem ou opinião, um sobrevivente empresarial e político, o Presidente Donald Trump.
Não é preciso ter estudado física pura para se conhecer a Terceira Lei de Newton. Também chamada de Ação e Reação, indica que para toda força de ação, existe uma força de reação, com a mesma intensidade e direção, mas em sentido oposto. A essa lei deve-se acrescentar outra, gravitacional. Reza ela que a força de atração gravitacional entre dois corpos é diretamente proporcional ao produto de suas massas e inversamente proporcional ao quadrado da distância entre eles. Ou seja, quem tem maior massa esmagará aquele com menor massa, atraindo-o e acelerando em velocidade até destruir aquele de menor massa no impacto com aquele de maior massa.
A despeito de o presidente brasileiro sempre ter-se orgulhado de nada ter estudado na vida, não deveria estar surpreso ao experimentar a Terceira Lei de Newton ou a Lei Gravitacional Universal. É claro que esse mandatário não sofre nada pessoalmente com tal rusga, já que se utiliza sempre do povo e da economia brasileiros como seus escudos humanos, no melhor estilo daqueles grupos odiosos com que publicamente demonstra simpatizar, atuantes no Oriente Médio.
A arma comercial utilizada pelo governo americano contra o Brasil (e também contra o Canadá, cujo atual governo teima em dizer coisas similares personificando relações internacionais e aliando-se a outros grupos, em tom bélico contra o dirigente atual dos Estados Unidos) ainda se situa no campo da ameaça, com salvos de advertência. Haveria espaço para o diálogo, desde que não esquecidas as leis de Newton acima.
Mesmo que a distância seja imensa entre Brasil e EUA, não cabe a só seus dirigentes definirem o que farão em prol de seus povos e da sua economia. Daí a lição sobre desconfiança ensinada por Weinberg.
Cabe aos povos de tais países (seus grupos de pressão), informados e preocupados, indicarem qual grau de sacrifício estão dispostos a fazerem para guardarem posição e sentirem-se orgulhosos de seus atos, não na próxima eleição, mas para a próxima geração.
De um lado, no campo brasileiro, há um velho líder sindical decadente, ancorado em um arranjo institucional frágil e questionável, com um discurso antiquado e compromissos com autocracias genocidas. No campo norte-americano há um presidente determinado, irascível, cuja paciência a desaforos - diferentemente dos brasileiros - é ínfima e que entende ser agora o momento de definir quem merece ser seu parceiro comercial e quem não merece, preparando o caminho do futuro da sua nação contra aqueles que se declaram abertamente seus inimigos.
A provocação feita pelo Pres. Trump ao Brasil não é personalíssima, ao meu singelo sentir, a despeito das interpretações sobretudo pelos campos políticos extremos brasileiros. A ameaça de impôr penalidades comerciais não é feita em nome de um clã decadente ou corrupto, como já indicado nesse outro post.
A provocação é muito mais ampla, criando enorme oportunidade para os verdadeiros brasileiros, sobretudo os formadores de opinião, questionarem-se: até quando as bravatas de um irresponsável arrogante, ignorante, suas provocações diante de platéias cativas ou meios de comunicação comprometidos, serão consideradas apenas como pitorescas, ao invés de se lhes dar a gravidade do que significam, indicando ameaça estrutural que urge ser combatida?