PEC 37 - a tão famigerada proposta de emenda constitucional já passou, mas vamos falar um pouco dela?

Vou abordar um assunto passado, polêmico, que mobilizou as ruas e petições nas redes sociais.

Os manifestantes, como é praxe hoje em dia, primam pela superficialidade. Desconhecem argumentos prós e contra. Nem ao menos leram o texto do projeto de emenda constitucional ou todo o seu processo de discussão e necessidade.

Enfim a PEC37, a que "acabaria com o Ministério Público", a que "garantiria a impunidade", foi rejeitada, enterrada e soterrada com pá de cal, mas a discussão não acabou. O problema não acabou.

Confesso que achei belíssimo o movimento DO CONTRA. No início eu até mesmo o apoiei, pois com tanta gente contra, a tal PEC deve ser mesmo PÉSSIMA!

Peraí.

Tenho cérebro. Discernimento. Sei ler, e até escrever um pouco. Por quê não investigar melhor o assunto, do que só seguir a boiada?

O assunto vem de vários anos, resultante de abusos de certos membros do Ministério Público, que cederam aos holofotes. Eles divulgavam fatos (ou semi-fatos) na imprensa, causando a destruição de reputações, a violação de direitos individuais. Legalmente, eles passaram a se sentir acima da lei, desobrigados de respeitar direitos fundamentais, por falta de previsão legal, POR FALTA DE FREIO.

E carro sem freio mata. Pior. Geralmente mata pedestre, salvando o maluco do motorista.

Remeto o leitor (informar requer leitura, leia quem quiser) ao parecer do Poder Legislativo (eleito pelo povo, esse mesmo que está correndo pelas ruas quebrando tudo e, na maioria, sonhando com uma melhoria do esquema atual):
 
http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/prop_mostrarintegra;jsessionid=846E16EA132662D64334D2C1E68A9998.node2?codteor=1001565&filename=Parecer-PEC03711-13-06-2012

Para quem não quer ler, transcrevo extratos:

Sem polemizar, e de forma bastante política e incrivelmente suscinta, para evitar embates com o poderosíssimo MP, Dr. Edson Smaniotto, representante da OAB manifestou-se favoravelmente à PEC, na 2ª audiência pública sobre a matéria, assim:


...a posição da entidade no sentido da aprovação da PEC por entender que a investigação policial produzida a latere pelo MP, numa persecução penal sem regras legais e sob critério de seletividade, significa uma grave preocupação pela ofensa que pode causar aos direitos individuais. Admite que o MP possa investigar incidentalmente, no inquérito policial presidido pela autoridade policial, porque a atuação direta daria ao MP, como parte acusadora no futuro, a possibilidade de criar a verdade material que mais interesse à estratégia da acusação, em detrimento do contraditório e das garantias individuais da Constituição, entendendo também que a expressão “privativa” não induz exclusividade.

Na 3ª audiência pública, Dr. Marcos Leôncio Sousa Ribeiro, representante da Associação Nacional dos Delegados de Polícia Federal disse:


A PEC se atém ao art. 144, que trata dos órgãos de segurança pública, da polícia judiciária e, em nenhum momento, do art. 129, sobre a competência do MP , e não extrai deste qualquer competência constitucional. Acrescenta que a PEC vem explicitar o óbvio, e seria desnecessária, se tivéssemos uma interpretação conforme a constituição, e não uma Constituição conforme a interpretação. Nos termos da Carta, e no estado democrático de direito estabeleceu se que a polícia judiciária investiga sob a fiscalização do MP, que é o órgão acusatório. A polícia judiciária trabalha com o MP na fase investigatória, não trabalha para o MP, como proteção do cidadão. O MP exerce sua atividade incidental de requisitar diligências investigatórias e o controle externo da atividade policial. Afirma que, de 88 para cá,o MP criou uma construção doutrinária e assim algumas decisões judiciais de turmas levantam a tese dos poderes implícitos de natureza constitucional, de que quem pode o mais, pode o menos. Contrapõe à referida tese o argumento de que acusar, investigar, defender e julgar não têm graduação, são coisas diferentes.

Na 4ª audiência, o Dr. Alberto Tavares da Silva, desembargador aposentado, salientou:

Cabe ao MP exercer o controle externo visando a apurar o desvio de conduta dos membros da polícia. Essa atuaçãodo MP é muito importante, levando até a legitimação de ação penal pública contra os crimes de abuso de autoridade. Então, temos papéis bem diferentes,que não se sobrepõem, por que se tivermos uma apuração pela polícia e outra
pelo MP, as duas paralelas, haverá duplicidade de energia apuratória e, se
houver contradição, indagar-se-á qual dos dois inquéritos deva prevalecer, qual deles é o legítimo,que o MP se servirá para formulação da denúncia senão o próprio?

Para ser justo, as manifestações das associações do Ministério Público defenderam muito bem a moderação, o uso do poder de investigar para fazer justiça, com excelentes argumentos para... manter seu poder crescente e intocado, sem risco ao Estado de Direito ou abusos contra Direitos Individuais. Ou seja, promessas de harmonia absoluta.

Ou seja, houve 4 audiências públicas... dominadas pela associação do MP, pois é claro que a raposa puxa sempre a galinha para seu canto.

O eminente jurista José Carlos Fragoso foi citado no parecer:

Não é possível,(...) permitir que o Ministério Público possa acumular as funções de investigador (que a ninguém presta contas), e de instituição encarregada de promover a persecução criminal. Trata-se de um acúmulo perigoso de atribuições, que, sobre ser ilegal e inconstitucional, é absolutamente inconveniente, pois dá lugar, pelo excesso de poder, a abusos intoleráveis.

Alguns dirão:

- Puxa, Dan. Que chato. Que anti-clímax. Então todo mundo está errado, e só você acha que está certo? Você está contra a corrente, Dan... Abra os olhos. A gente se mobilizou todo, agora inclusive estamos enviando emails ao mundo todo identificando os autores da PEC37 para que eles sintam-se acuados (mesmo depois de votada sua rejeição), para que eles não possam sair de casa, que suas famílias se sintam envergonhadas... vamos excomungá-los, bani-los da sociedade... quem sabe, algo pior?

Afinal, são corruptos defendendo corruptos... Será? Leram o link que mandei acima?

Leiam o artigo 2 da PEC. Não acaba nada com o MP. Apenas o enquadra, pois houve abusos, por mais que o papel de carta seja cor-de-rosa.

Conclusão:

As redes sociais não produzem democracia. Elas produzem uma FALSA SENSAÇÃO DE DEMOCRACIA.

No exemplo da PEC, e talvez do que virá por aí (plebiscito, constituinte exclusiva, imposto sobre grandes fortunas, submarino nuclear brasileiro, bomba atômica brasileira, sei lá o quê), fica claro que as redes sociais permitem que cada um sinta-se ENGAJADO.

O problema é a CAUSA. É tentador integrar o GRUPO, sem dar a mínima para a causa, seu conteúdo, seus promotores, inventores.

Parece que ainda não sabemos usar as redes sociais para coisas sérias.

Pior.

Parece que elas reduzem nossa responsabilidade, pois ao aderirmos a propostas coletivas fazemos amigos (pela eleição de inimigos comuns! Êba, odiamos juntos!) e no momento em que atuamos em turma, em grupo, em bando, se mandam bater, bato, se mandam parar, paro.

Engraçado. Temos tanta inteligência, tanta informação disponível, tanta tecnologia.

Mas a usamos para isso?

O MP não precisava do poder todo que sua tese conseguiu construir.

A PEC 37, estou certo, serviria para disciplinar uma matéria que tem sido objeto de abusos.

O MP não se autoregula, autocontrola. Precisa ter freios constitucionais, sob pena de se tornar um quarto poder.

Não acho que o MP e suas associações, em interesse mesquinho e próprio, promoveram a guerra das redes sociais. Não acho também que iniciaram o movimento de caça às bruxas a todos aqueles vinculados à PEC. Conheço quadros fantásticos desse serviço público e gente genuinamente comprometida com a legalidade. Mas poder é poder... e eles ficaram muito mais poderosos agora... o que pode não ser bom.

Ao leitor, que julgue como melhor lhe aprouver.

Só não quero ser gado. Sair por aí balançando a cabeça e fazendo barulhinho com sininho no pescoço, alegre por integrar uma boiada que não sabe onde vai, mas que possui a certeza de que será ordenhada diariamente e, ao final dos tempos, servirá para corte.





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