Mercenários: nada a perder, tudo a ganhar e a pilhar

Desde muito jovem, fui sensibilizado e sensibilizo-me pelo que há de errado no mundo, inclusive a desonestidade. Cada um usa seu percurso pessoal, sua vivência, para buscar entender e inserir-se no mundo. Esse post visa entender dilemas no Brasil de hoje a partir de minha visão (você certamente terá sua própria).

Tenho plena consciência de minha sorte em ter nascido e sido criado em um ambiente onde o senso de realidade era presente, em que a alegria e o sofrimento eram sabidos como condição humana. O conforto material e a comida sobre a mesa sempre foram um privilégio reconhecido, valorizado e agradecido.

Jovem ciente de que o mundo precisava ser melhorado, interessei-me por idéias revolucionárias, próprias ao espectro da esquerda política. Valorizar o ser humano "contra o jugo dos poderosos de toda sorte" (políticos, econômicos, influentes, etc.) sempre me pareceu justificado. Posteriormente, tomei consciência de como muita gente manipula o ideal da Justiça, sobretudo a social. Desenvolverei isso mais adiante.

Dois fatores foram fundamentais para a construção de minha consciência humana e formação moral.

O primeiro fator é ser filho póstumo de um fugitivo do Holocausto. Aprendi desde o útero que minha existência foi algo extremamente improvável. A morte do meu pai antes do meu nascimento e o genocídio do povo judeu sempre foram fatos duros e reais em meu entorno. O Holocausto é um alerta insistente sobre o impulso assassino das bestas com quem coabitamos. 

Aprendi ainda que o vitimismo não leva a lugar algum e não deve ser invocado por quem deseja ser respeitado. Ter pena é um sentimento humano valoroso, mas quem projeta a pena nos outros para além do reconhecimento dos fatos, na maioria das vezes persegue favores e privilégios (como atualmente ocorre com a política identitária dos movimentos promotores do que se nomina racismo reverso). Meus avós, tios e seus amigos, sobreviventes de Campos de Concentração e da perseguição genocida, com quem convivi e conversei, jamais se postaram como vítimas do mundo, a despeito do preço irreparável que eles e suas famílias pagaram. Aprendi, desde muito cedo, que a verdade, o conhecimento e a meritocracia devem ser o único norte para buscar-se uma vida íntegra e verdadeira, ciente que o ser humano é falho, fraco, influenciável e busca acolhimento e reconhecimento, sempre.

Conhecer a história torna-se a melhor cura: evita repetirem-se atrocidades do passado. A importância em dar voz aos que sofreram, permitindo a divulgação e amplo conhecimento dos fatos horríveis perpetrados contra inocentes por causa de ideologia assassina visando punir culpados é necessário, expondo gestos de crueldade. O uso didático dos fatos como ocorreram e ocorrem visa evitar sua repetição e a manipulação da história.

O segundo fator foi ter nascido e criado no Brasil durante o período militar, onde confrontos entre PM e manifestantes ocorriam sob minha janela, no centro de Belo Horizonte (aos quais assistia, assustado) onde morava. "Carteiradas" e o tal "sabe com quem você está falando?" eram moeda corrente em minha infância e adolescência, em que o medo de autoridades (sobretudo as fardadas) criava ambiente propício a narrativas de toda sorte, várias delas manipuladoras, mas românticas (como a falácia da justiça social cubana, na realidade país sem liberdades individuais e repressão mais violenta que a brasileira durante o pior do regime militar). 


O período glorioso do milagre econômico e do futebol dos anos 1970 conflitava com um governo bruto em que gestores públicos obtusos e corruptos ignoravam demandas sociais prementes, a despeito de algumas belas e úteis (dentre outras faraônicas e inúteis) obras de engenharia. Governos militares brasileiros foram incapazes de apaziguar ânimos e harmonizar interesses de uma sociedade heterogênea que sempre clamou por colaboração e convivência pacífica (jamais atingida, como 13 anos da cleptocracia petista comprovaram, já que porta-bandeiras de uma suposta justiça social).

O ideário construído pela esquerda brasileira, nos anos de minha adolescência, perdeu-se. Fui atento observador da realidade transformadora para pior e a esquerda latino-americana foi para o esgoto. Aquela esquerda idealizada, justa e opositora ao que havia de errado, foi sepultada na medida em que dela se apropriaram mercenários

Mercenários são gente contratada para fazer guerra a soldo de partes interessadas na vitória. Fazem qualquer coisa por uma boa paga, nada tendo a perder, pois são miseráveis (moral e materialmente). Eles não sonham com nada, mas muitas vezes nivelam o mundo pela destruição, sendo sucedidos (ou associados) por gente que promete construir algo bom a partir das ruínas que eles mesmos causaram. Schumpeter, economista austríaco, obviamente em razão da guerra, achou ver a Fênix em meio à sua Europa arrasada, moldando a teoria em torno da destruição criativa que sua geração vergonhosamente promoveu.

Os revolucionários franceses (liderados pela burguesia, gente que vivia nas cidades, nos burgos, numa época em que a grande maioria da população era rural) desejavam tomar o lugar da realeza, incômoda em seus gastos, apetites e escolhas (inclusive militares). Eram movidos por ambição de poder material e político, bem como, naturalmente, movidos por inveja de uma vida em palácios e poucos impostos. 

E assim, o povão francês foi manipulado por gente instruída, entendida dos meandros do poder, influente (certamente dona das mídias da época...). Gente comum matou-se nas ruas, inebriada pelas promessas de liberdade de líderes inflamadores, por mentiras contadas mil vezes e inspirada por atos simbólicos como a Queda da Bastilha (nada mais que a soltura de presos comuns da cadeia, revisitando injustiças...). Manipulados para irem ao delírio de que o Rei seria substituído pela justa representação popular, o povão apoiou o golpe institucional, frequentando os mega-espetáculos públicos da guilhotina (em plena Place de la Concorde, coração de Paris). Assim, a França tornou-se a república dos nobres, das castas, problema visto até hoje ao não conseguir lidar humanamente com os Roma (ou ciganos) e outras etnias imigrantes. A França não modernizou sua sociedade, hoje  fundamentalmente decadente e desagregada, como testemunhado pelas hordas de imigrantes que se mudam para o Québec ou aqueles que ficaram no continente e ousam denunciar sua disfuncionalidade.

Os revolucionários bolcheviques fizeram a mesma coisa, em repetição tediosa da história francesa. Alguns russos bem formados, inteligentes e ambiciosos, antes exilados, retornaram ao seu país vendendo a idéia de que a realeza despótica e incompetente (os Romanoff) seria substituída pelo povo, pelo "proletariado"  tão abusado pelos donos de terras. 

Cooptaram os nobres e as forças armadas russas na condução de um golpe institucional sanguinário. Quando revelada a real intenção dos "revolucionários", era tarde demais para aqueles que se haviam deixado inebriar. Um a um, membros da elite russa revolucionária foram assassinados, cruel e friamente. A tirania tomou conta daquele território, para nunca mais o abandonar. O regime genocida-mafioso de Putin e a emigração em massa de cérebros russos nas últimas décadas confirmam facilmente essa afirmativa.

Já os mercenários revolucionários brasileiros ainda possuem uma face viva, facilmente reconhecida na figura de Lula, candidato "das massas". Manipulador, esse populista sem cultura ou moral é a melhor representação do que Mário de Andrade descreveu em Macunaíma, como retratei nesse post. Retirante nordestino, no melhor e no pior sentido, Lula é um fenômeno exemplar da ascensão social de um mercenário. Aqueles que lhe permitiram e continuam permitindo com que ascenda ao poder possuem uma agenda clara: a corrupção na dissimulação.

É uma troca justa, admita-se: dão o direito a um nada, a um ser ignóbil em virar presidente, desde que jogue o jogo dos poderosos. Lula e sua gangue, bem como a legião de idiotas-úteis que nega a existência da Lei da Gravidade e de outras obviedades (como o fato de o meliante ter sido condenado, após longo e devido processo legal em 9 processos por corrupção), permitem com que esse marionete encubra interesses escusos como aqueles da nobreza francesa ou máfia russa, conforme descrito antes.

A manipulação de palavras e idéias é livre. Assim como o choro... 

Causa-me pavor, entretanto, a adesão dos principais empresários, juristas, meios de comunicação e parcela pretensamente intelectualizada do Brasil a um projeto de poder fundado na mentira, na falsidade, na manipulação barata de fatos e valores óbvios demais para serem explicados.

Felizmente, não pago o preço das idiotices feitas pela elite brasileira, pois estou em auto-exílio no Canadá desde 2009. Meu sofrimento quanto ao Brasil, sinto-o à distância, pois ainda que Bolsonaro não seja a melhor opção em valor absoluto ao eleitor, pelos ranços de sua biografia, ele foi em 2018 e parece ser em 2022, em valores relativos, a resposta ao combate à corrupção que irriga as veias de Lula e de seus companheiros no crime, cada vez mais orgulhosos de sua impunidade.

Mandatos do PT, ao meu sentir, assemelham-se à precisão do Código Penal sobre o crime continuado: cada dia, hora, minuto e segundo em que estão no poder servem para perpetuar corrupção, roubalheira, manipulação, mentira e impunidade.

Lula, seus aliados e eleitores não são o progresso. 

Lula, seus aliados e eleitores não são revolução alguma. 

Lula, seus aliados e eleitores não proporcionam mudança positiva e significativa alguma à sociedade brasileira. Eles aliam-se ao atraso, à nova oligarquia que se pretende revolucionária, mas que busca os mesmos privilégios já descritos.

Espero que em janeiro de 2023 comece a surgir uma nova consciência brasileira de coabitação. Essa será a única solução para esse país de grande potencial, heterogêneo e rico. 

Caso o país continue sendo vítima da dicotomia violenta vista abundantemente no debate e discurso político, no exercício dos poderes - todos os poderes, mais notadamente, em tempos recentes, o cambaleante poder judiciário - mais uma geração viverá sob o manto (transparente) da mentira, da impunidade e do sofrimento.

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