Mau uso de vocábulos

 É lastimável ver como tem gente que ganha projeção usando e abusando de certos vocábulos.

Ataques a prédios públicos ou privados sempre devem ser condenados, obviamente que menos do que a pessoas, já que vidas valem muito mais do que objetos.

O que ocorreu há poucos dias em Brasília foi programado e visou beneficiar politicamente todos os campos, sobretudo os radicais, em um país profundamente dividido e insatisfeito com os rumos da política.

Ocorre que há dois vocábulos que foram violentados por gente importante demais para eu apenas assistir passivamente.

O primeiro vocábulo é "terrorismo" ou "terrorista". 

Até o episódio, quem destruía bens era vândalo. E quem os furtava, ou mesmo roubava (furto com emprego da força), era chamado de assaltante ou ladrão.

Vários manifestantes do 8 de janeiro de 2023, em Brasília, adentraram instalações e prédios públicos para manifestar e dentre tantos vandalizaram e furtaram bens alheios.

Ao que me consta, terrorista é aquele que visa amedrontar causando o maior número de vítimas possível, aquele que espalha medo por seus atos e ameaças.



Ora, não houve vítimas nas manifestações violentas contra patrimônio em Brasília.

A despeito disso, ministro do STF, governo, gente de variadas mídias chamaram manifestantes de verde-e-amarelo de terroristas. 

Igualar quem destruiu as Torres Gêmeas, em 2001, quem seifou vidas em atentados covardes como ao Charlie Hebdo em Paris, à sede da AMIA em Buenos Aires ou à Pizzaria Sbarro em Tel Aviv, a quem quebrou vidraças e móveis em Brasília é um impropério. É um abuso de linguagem com um único objetivo: desumanizar os manifestantes e descreditar qualquer item de sua pauta reivindicatória (que, aliás, desconheço), sendo desonesto.

O segundo vocábulo que desejo tratar é "campo de concentração".



O modo ignóbil com que os mais de 1200 manifestantes presentes em Brasília ficaram ilegalmente presos, em um ginásio, não permite comparar tais instalações a campos de concentração

Poderiam os presos estar motivados pela justificada indignação pela eleição de um criminoso condenado do juiz ao STJ à presidência, poderiam não necessariamente integrar grupos de vândalos que adentraram prédios públicos para destruir e pilhar. Dentre eles havia idosos e crianças, acampados havia semanas defronte a QG do Exército, sonhando com um regime forte para combater sua percepção de que a cleptocracia retomou conta do Brasil (um delírio, não é mesmo?).

Campos de concentração já existiam antes do Holocausto, mas viraram sinônimo de antecâmaras da morte pelo significado dado pela doutrina e ação genocida contra sobretudo judeus na Segunda Grande Guerra. Eram locais totalmente insalubres onde seres humanos eram colocados uns sobre os outros, desumanizados, para morrerem de frio, doenças como tifo e tuberculose, e fome, sob os olhares de seus torturadores, algozes nazistas de várias nacionalidades (já que a simpatia pelo genocídio judeu não era exclusividade dos alemães, a despeito de Hitler os ter inspirado, instrumentalizado e autorizado a cometerem atrocidades indizíveis).

A guerra das palavras, com seu uso indevido, visa banalizar seu real significado.

Quando usadas erradamente, abarcando delitos ou fatos menores, essas palavras visam legitimar uma narrativa falsa, um entendimento que nada tem a ver com fatos, constituindo mais um elemento de desonestidade tanto das mídias quanto dos poderosos que as usam.

E assim, de abuso em abuso, de desrespeito em desrespeito, banaliza-se o tratamento cruel tudo fazendo equivaler.

Palavras, tem-se dito, são como armas. Portanto, nada melhor do que usar apenas aquelas adequadas, evitando desvios que visam agendas desonestas, perigosas.

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