O empreendedor e os frutos

Após décadas trabalhando com empreendedores, entendi que tem gente que tem iniciativa, abre caminhos, enxerga lá longe, quebra paradigmas, desafia estruturas, para alçar algo melhor para si e a sociedade, mas a maioria desses não saboreia os frutos de sua visão e seu esforço.

Isso não ocorre apenas nos negócios, com visionários que geralmente não sabem organizar suas finanças, não sabem navegar na sociedade empresarial, financeira, concebendo grandes idéias que acabam nas mãos de quem entende a engrenagem social e empresarial muito melhor... isso acontece também com líderes populares, políticos, que não abrem mão de suas idéias genuínas, não arriscando suas idéias em troca da estrutura, do encaixe em uma fórmula que não é a sua.

Inventores são sabidamente os grandes empresários frustrados. Os inventores da lâmpada, do telefone, de novas tecnologias e mesmo do facebook, são visionários que não têm fôlego ou estômago para entrar no jogo dos interesses que sucede sempre a belas descobertas e concepções... eles acabam sendo engolidos, suas idéias furtadas, para resultarem meramente em resultado financeiro.

Na política vemos a mesma coisa.

Há muitos ideólogos, pessoas que acreditam em mudanças, em aprimoramento da sociedade. A maioria que participa de atos públicos, que protesta nas ruas ou nas redes sociais, não deseja abrir mão de suas convicções e ambições para participar do jogo como ele é. São visionários que desejam estar lá no futuro que almejam, com que sonham, e não ver suas idéias, seus ideais, reduzidos a uma folha de exigências para gerar um pequeno ajuste de rota da sociedade.

A realidade é que as mudanças, salvo as revolucionárias e destrutivas (vou usar unicamente o exemplo da Revolução Cultural de Mao, que na China matou dezenas de milhões de pessoas apenas para enterrar a cultura patrimonialista anterior para adotar-se a ditadura dita do proletariado, inspirada no totalitarismo soviético) são lentas, são pequenos os passos... como as longas jornadas.

Nos últimos 25 anos votamos em gente que combateu a ditadura, que encarnava nossa esperança de maior justiça social com respeito aos valores brasileiros, a essa riqueza e diversidade humana que são a marca do Brasil. Cantamos também com aqueles que cantavam do exílio, de saudade da pátria livre, onde a repressão às idéias e aos gestos não deveria existir.

Aqueles que lutaram, seja nas ruas, seja nas letras, seja na música, contribuíram enormemente para que o país amadurecesse, que as instituições se fizessem mais fortes que as pessoas que as dominavam em nome de uma ideologia exclusiva, obtusa e vesga sobre as realidades do país.

A social democracia alcançou um lugar no país, dividido entre maximização da riqueza e lucro, de um lado, e a inclusão social de outro. Os propósitos na época dos militares e do governo civil não legitimado (Sarney) eram verdadeiros, cantados em verso e prosa. A nostalgia da liberdade pouco experimentada colidia com a crescente urbanização e modernização do mundo.

Os empreendedores daquela época não conseguiram e não conseguirão, em todo o seu matiz, ver eles mesmos a realização de alguns de seus propósitos mais puros. Não conseguem pois aqueles que foram adiante, corromperam-se, abrindo mão dos propósitos para se encaixarem na dinâmica do poder e da grana deixada pelos militares. Será a nova geração, que recebeu o legado e que precisa valorizar o que ele tem de bom, quais os princípios da redemocratização do Brasil e da inclusão social responsável sem ruptura, que edificará uma nova estrutura, nas bases lançadas lá atrás, na época romântica de um Brasil justo e seguro.

Os que historicamente se comprometeram a mudar a realidade do país, respeitando a sua diversidade, podem auxiliar na tarefa, apenas se entenderem que seus sonhos não envelheceram, mas foram distorcidos por uma realidade massacrante que precisa mudar, que mudará, pelos herdeiros dos seus propósitos, não dos métodos que vêm sendo utilizados desde a redemocratização, pois os conhecemos bem e o condenamos com toda a nossa força e coerência.

Da mesma forma que a revolução e o sangue não criam uma nova sociedade sã e feliz (veja-se a China pós Mao, veja Cuba hoje, Venezuela, Coréia do Norte, onde sem liberdade ninguém acha graça nos benefícios que o estado totalitário de esquerda proporciona), as transformações precisam acontecer, apesar de lentas. O legado de transformação do país nessas 3 décadas é importante, sensível, mas está tomando uma direção errada, posto que as idéias e os sonhos foram domesticados por uma estrutura perversa, pelo poder como finalidade em si mesma, ao invés daquilo que pregávamos, por exemplo, no Movimento Diretas-Já, do qual honrosamente participei, enquanto estudante de Direito.


Se fizermos a juventude brasileira atual entender que não deve se render à estrutura em que vivemos, devendo desafiar - com inteligência - o que os partidos e a forma de exercício de poder no Brasil têm feito (enterrado sonhos e imposto a corrupção, com absoluta falta de prioridades, como edificar templos do futebol em cidades sem esgoto), para permitir o exercício da cidadania a todos os brasileiros (inclusive os incultos), talvez as coisas melhorem.

É bom acreditar que aqueles propósitos e sonhos de décadas atrás ainda encontram eco em algumas cabeças e corações... a despeito de vários daqueles que sonhavam terem se convertido em seus traidores, como o PT e seus partidos de apoio, em especial o PMDB.

Mais lidos

Mentiras de Estado

Com ou sem máscara?

Ditadura do Judiciário exposta: Congresso Norte-Americano

A democracia-ditadura: o poder sem representação

Manipule e influencie os jovens: eles poderão ajudar no esforço destrutivo de amanhã

Um texto magistral para a magistratura brasileira