Sociedade civil versus Alexandre de Moraes, Round 1

Estudei Direito não apenas para ter um ofício através do qual eu poderia me sustentar e proporcionar uma vida próspera e confortável para mim e minha família. No curso de Direito tive grandes mestres que deram continuidade a vários ensinamentos jurídicos e éticos com que eu já tinha me deparado, inclusive religiosos: para o progresso civilizatório ocorrer é necessário que se abra mão da brutalidade e da autocracia, por meio do Estado de Direito.

Os jornais de hoje dão conta que várias seções da Ordem dos Advogados do Brasil exigem providências contra os demandos do ministro do STF, Alexandre de Moraes, que impede o exercício de direitos básicos em qualquer país que se arvore funcionar segundo o Estado de Direito.

Acredito que a indignação da classe à qual pertenço não se dirija unicamente ao citado ministro. Os demais membros da mais alta Corte vêm atuando sem eira nem beira, há vários anos, usurpando direitos e atribuições de outros poderes, navegando incólumes diante do silêncio e da covardia suprema do Congresso Nacional. 



O recente bloqueio de contas causando impedimento de exercício de atividade empresarial, de ofício (ou seja, sem que ninguém tenha sido ouvido, nem mesmo o órgão acusatório segundo o sistema brasileiro, o Ministério Público) de supostos financiadores de atos de protesto contra uma eleição questionável fere fundamentos básicos do direito. 

As eleições 2022 foram palco de manobras inconstitucionais, permitindo-se a um descondenado constar da cédula, no que constitui ofensa a qualquer indivíduo minimamente racional e ético. 

Protestar é, portanto, legítimo, não significando quebra da ordem democrática, muito pelo contrário!  Não precisa ser gênio, advogado, promotor ou juiz para entender que o abuso está ocorrendo.

O Brasil encontra-se em pleno estado de exceção já que negados direitos básicos que minha geração lutou muito para resgatar (a geração das Diretas-Já e promoção dos direitos individuais contra o autoritarismo). A tendência parece ir no sentido da piora dos desmandos, diante da rapidez e desenvoltura com que qualquer crítica aos supremos (Supremacistas? Illuminati?) é silenciada.

Quando juristas de calibre ético questionável, posto que simpatizantes ou mesmo militantes de políticos  corruptos e condenados em diversas instâncias, uniram-se para escrever um Manifesto pela Democracia, demandos no STF já ocorriam. Como sectarismo não combina com estado de direito, tais juristas justificaram o  atual regime de exceção como urgente e necessário para proteger o país segundo narrativa que entoam há 4 anos: de que Bolsonaro sonharia em impor o regime de exceção no país. Esse grupelho foi beneficiado, ainda que por pouquíssimos votos e uma abstenção jamais vista, já que a violência jurídica contra vozes dissonantes as tem calado e permitiu a ascensão de um sujeito ligado à corrupção epidêmica.

Pergunto: como tais "juristas" arvorar-se-iam alguma dignidade não apenas para praticar, mas sobretudo para ensinar o direito, se alinham-se a burocratas autoritários?

O Canadá teve um episódio lastimável no início do ano de 2022. Vários cidadãos se mobilizaram país afora. Muitos reuniram-se em Ottawa, bloqueando ruas em um inverno gélido, protestando contra medidas discriminatórias aos que não desejavam nem aceitavam o comando estatal de seus corpos. O governo federal impôs vacina e passaporte vacinal para qualquer cidadão trabalhar ou deslocar-se pelo país. 

O governo Trudeau, de forma abusiva e equivocada em todos os sentidos, invocou uma lei emergencial e impôs bloqueio de contas aos manifestantes, desde o que doou 1 dólar até aqueles doadores de milhares de dólares aos organizadores dos protestos. Pouco tempo depois, o governo voltou atrás. Uma comissão de inquérito parlamentar foi instaurada, cujos detalhes contra liberdades civis podem ser encontrados aqui.

Qualquer autoridade brasileira, de nome José, Manoel ou Alexandre, pode e deve ser responsabilizada e seus poderes suspensos, se e quando dos mesmos abusar.

O Brasil já teve seus momentos ditatoriais. Eles foram funestos, como poucos hão de discordar. Os brasileiros sonham com democracia participativa, com o poder partilhado pelo povo e com o fim de privilégios, sobretudo aqueles pagos com recursos do erário.

Impedir o devido processo legal sob justificativas ideológicas, como a Min. Carmen Lúcia descreveu em seu trágico voto impondo a censura ao país, é uma ofensa à cidadania.

Pessoas que se alinham a poderosos covardes ou violentos são uma desgraça para a humanidade.

Como profissional do direito que viu o resgate do direito de greve, de manifestar, de associar-se, que presenciou da janela de casa na década de 1970 soldados massacrando com cassetetes dissidentes do regime, entendo que a violência perpetrada diuturnamente pelos supremos deva cessar já. Todos possuem direitos, não apenas os amigos dos poderosos...

Espero que a OAB resgate sua tradição cidadã, deixando de ser puxadinho do PT para representar o melhor que pode defender: o estado de direito e o devido processo legal.




 

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