Ter ou ser

O livro de mesmo título, de Erich Fromm, que li na adolescência, é revolucionário, no sentido de colocar-nos a questionar sobre o sentido filosófico da vida. Questionar significa não aceitar passivamente o status quo. Do ponto de vista ideológico, o livro propunha questionar a sociedade de consumo, coisa que continuamos a fazer, pois nosso materialismo consome relações e, ao final, quando excessivo e insustentável, o planeta.

Não desejo me ater ao questionamento ideológico, pois este já é conhecido de quem tem me prestigiado com seu tempo para ler essas mal-traçadas linhas. Esse questionamento adolescente acabou para mim, pois não se trata de capitalismo versus socialismo, de extremo isso ou aquilo, mas de existência digna a todos os seres vivos, com exploração sustentável do planeta. Nenhuma das pontas, dos pólos, tem razão, apenas o meio-termo permite o conforto material como uma necessidade responsável para consigo, a sociedade e o planeta.

Fromm, para mim, definiu de forma interessante o que estamos, mesmo em uma era absurdamente consumista, conseguindo realizar: o ser.

O ser humano conseguiu abstrair sua existência de forma incrível.

A conversão das forças da natureza em conceito divino é nada menos que a sublimação do ideal humano pelo seu reflexo no etéreo, pura abstração, mas com a pitada humana. Trovão não é humano, mas se é criado por um ou vários deuses, e esse deus tem "alma" humana... porque nos inventou (ou vice-versa, como creio), então conseguimos refletir em tudo o conceito humano.

Na medida em que esses trambolhos tecnológicos estão se desenvolvendo, constato que as novas gerações não mais brincam com coisas concretas, mas sim com coisas totalmente virtuais.

Hoje, alegria de criança um pouquinho maior não está em bola ou gangorra, mas em um programa novo, um app. Isso é sustentabilidade.

Se faz mal socialmente, fisicamente (em virtude do sedentarismo precoce), etc. aí são outros 500. O que defendo é que as novas gerações estão sublimando sua existência de uma forma que permitirá com que elas, diferentemente de nós, que somos apegados ao material (mais que eles, certamente), consigam andar adiante sem destruir tanto o planeta quanto nós, os "concretos".

Para não ficar longo demais esse post, o raciocínio é simples, e enterra totalmente a idéia de sociedade de consumo versus socialismo ou outras besteiras ideológicas que precisam manter-se confinadas a museus (pois hoje a diferença ideológica é apenas dos que preferem ditadura a democracia participativa, independentemente se de esquerda, direita ou centro).

A idéia central é: podemos ser. Não precisamos ter.

Vejo nas ruas o tal communauto. Ninguém é dono do carro. Entra no site, agenda o uso, vai lá, pega, usa e estaciona onde quiser. O sujeito É móvel, se locomove livremente, mas não TEM o automóvel... pois entendeu que não precisa TER...

O mesmo ocorre com imóveis, com a popularidade de conceitos como home-exchange, airB&B, e tantas outras invenções que nos convencerão que somos apenas locatários de coisas. Não somos proprietários de nada... por mais que caixão seja fabricado com gavetas.

Acredito piamente que o futuro vai ser bem melhor que o presente, sob a perspectiva que preocupava tanto a Fromm... e tudo isso será devido à engenhosidade humana... que funciona tanto para o bem quanto para o mal...






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